Você somente pode dar aquilo que você é



Durante muito tempo acreditamos que na educação escolar somente poderíamos dar aos nossos alunos o que temos, ou seja, o conhecimento. Essa ideia ficou tão arraigada em nosso entendimento que quase não sofreu contestação e, aos poucos, a educação passou a ser confundida com o ensino, tanto que as escolas brasileiras passaram a ser oficialmente denominadas de unidades de ensino, e não de centros educacionais, e os professores passaram a ser instrutores, na ilusão de que estão na escola para ofertar ou para dar do seu conhecimento, do seu domínio intelectual para os alunos. Digo ilusão, pois se trata de um equívoco. Qualquer indivíduo, seja criança, jovem ou adulto, pode adquirir conhecimento por esforço próprio através dos livros, dos vídeos, da internet, da interação com outras pessoas, das experiências vivenciais. E quem foi que disse, e provou, que o ato de educar é a mesma coisa que o ato de ensinar? E quem disse, e igualmente provou, que é possível ensinar alguém quando esse alguém não está afim de conhecer?

A verdade é que o sistema de ensino, que remonta aos primórdios do século 19, quando formatamos a sala de aula com carteiras enfileiradas, alunos quietos e passivos, provas e notas, está falido, não serve mais. E podemos prová-lo: temos hoje aproximadamente 25 milhões de analfabetos funcionais em nosso Brasil, o que significa que são pessoas que passaram pela escola e não conseguiram desenvolver a leitura e a escrita, a interpretação básica de textos e as operações matemáticas formais. E estou falando apenas do aspecto cognitivo. O que dizer do aspecto emocional dessas pessoas? Isso é mais difícil porque muitos especialistas consideram essa área como subjetiva, não é possível mensurá-la estatisticamente. Como se afeto e amor pudessem ser metrificados. E o que dizer da aprovação automática, que oficialmente todos negam sua existência, mas que na prática existe, principalmente na escola pública, quando nos deparamos com alunos da 9ª série do ensino fundamental que são verdadeiros analfabetos?

Diante de tudo isso só nos resta uma constatação: o professor não existe para ensinar e sim para orientar, tutoriar, facilitar e estimular o aluno a querer aprender, tirando de si a motivação para se desenvolver de forma integral, ou seja, nas áreas cognitiva e emocional. Já dizia Montessori: "um sinal claro do sucesso de um professor é poder dizer: agora as crianças trabalham como se eu não existisse".

Entendamos esse enunciado. O professor deve trabalhar a autonomia do aluno, o que não é possível somente dando aula. Para isso deve formar grupos de estudo, pesquisa e trabalho com 5 a 6 alunos em cada grupo, todos eles estimulados a estudar por temas, com objetivos a alcançar, debates com toda a turma, arguições e apresentação final. É o que chamamos de trabalho por projetos, transformando a sala de aula em espaço de aprendizagem coletiva, e o professor em orientador do processo. Isso no que toca ao desenvolvimento cognitivo.

Quanto ao desenvolvimento emocional dos alunos, acontecerá se o professor tiver amor à educação, à escola e ao trabalho que realiza, sempre acreditando no poder da educação na formação de indivíduos e comunidades éticas e solidárias. Aqui fica bastante evidenciado que o professor somente pode dar aquilo que ele é, e não o que ele conhece.

Portanto, professor, reveja seu pensamento sobre o educar e o ensinar. Por que não transformar sua postura? Por que não revisitar sua didática e sua metodologia? Pense nisso, pois precisamos, com urgência, modificar o triste quadro da atual educação brasileira e os prognósticos futuros de nossa sociedade.

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