segunda-feira, 27 de setembro de 2021

O professor e a ética

É inconcebível que o professor não se prepare adequadamente para o exercício de sua profissão, que não respeite a autonomia do aluno, que não realize constantemente sua autoeducação, e que não faça a avaliação honesta e profunda de sua conduta na escola. Não podemos aceitar que o professor simplesmente chegue na escola para cumprir burocraticamente seu trabalho de dar aula, e não podemos aceitar porque ele é um ser humano que lida com outros seres humanos, os alunos, e também porque seu papel, na verdade, não é de dar aula, é de ser mestre, educador, orientador das crianças e jovens que depositam nele a esperança de suas vidas.

A ética é indissociável do professor, do ato de educar. Como pode o professor não se preocupar com os exemplos de conduta pessoal que fornece aos seus alunos? Como pode estar na escola sem provocar reflexões sobre normas e valores que, querendo ou não, irão se refletir na realidade social?

A não preocupação com a ética, com a conduta, com o respeito, com os valores que regem a vida, provocam aberrações que desviam a educação de sua finalidade de formar o caráter, criar bons hábitos, forjar cidadãos conscientes. Vejamos algumas falas e condutas de muitos professores, ilustrando esta afirmação.

Ai, ai, mais um dia na escola, que chatice!

Eu não chamo mais a atenção de ninguém, que cada um cuide de si!

A diretora pediu que eu não fume no pátio, ora, eu fumo quando quiser e onde eu quiser!

Se eu tenho que aplicar testes, então eu aplico; se eu tenho que dar aula, então eu dou; não estou aqui para esquentar minha cabeça!

Não arrumo problema com os pais, comigo não tem reclamação, dou as notas, faço todo mundo passar de ano, e pronto!

Estão falando em nova proposta pedagógica, outra metodologia: estou fora, não quero ter trabalho, não!

A fulana que me aguarde, ela vai ver o que é bom, vou puxar o tapete dela!

Poderíamos transcrever muito mais frases, expressões e condutas dos que se dizem professores e não têm nenhuma ética, não têm nenhum amor à educação, chegando ao cúmulo de ouvirmos de uma professora do ensino fundamental que “ser professor e trabalhar numa escola é tudo de mais ruim que pode ter na vida!

É por todas essas coisas que a realidade social não é satisfatória, que convivemos com a injustiça, a violência, a miséria, a exclusão. É por todas essas coisas que a realidade escolar pública é ruim.

Mas a culpa não é exclusiva dos professores. São culpados também os responsáveis pela sua formação nas universidades; são culpados também os governantes que politizam a educação. São muitos os culpados e múltiplas as causas da degeneração da educação, da escola e da sociedade.

Qual o caminho para consertar o que desconcertamos? É a educação, mas a educação com ética, a educação em valores humanos, a educação que forma pessoas conscientes e solidárias, que então transformarão o mundo. Para termos essa educação, iniciem os professores sua autoeducação, transformando seu trabalho e fazendo da escola uma grande família, com olhar no futuro, pois as crianças de hoje serão os adultos de amanhã. Que pessoas queremos, amanhã, à frente da nossa sociedade?

Deixo aqui o convite para pensarmos seriamente, e profundamente, a resposta.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Paulo Freire na minha escola

Você me pergunta, caro amigo, se eu contrataria Paulo Freire para ser professor na minha escola, e eu lhe respondo que se tivesse uma escola na qual fosse o responsável, não hesitaria em contratá-lo. Como deixar de fora um educador reconhecido internacionalmente, com pensamentos e práticas profundas sobre educação?

Agora você me pergunta se eu concordo com tudo o que Paulo Freire falou, escreveu e fez. Naturalmente, não, pois é humanamente impossível concordar cem por cento com o pensamento de outra pessoa, e essa possibilidade de discordar, de debater, de reaprender mais nos aproxima.

Aliás, por falar nisso, tenho certeza que Paulo Freire, neste momento em que parte da elite governamental o ataca com críticas severas – a maioria sem base –, ele não se furtaria ao debate, inclusive acatando as críticas bem construídas sobre seu pensamento educacional. Agora, o que não faria, é atacar nem as pessoas, nem as instituições, não entraria em polêmicas inúteis e de caráter pessoal.

Dizem que Paulo Freire estragou a educação brasileira, é o culpado por tudo de ruim do nosso sistema educacional. Sinceramente, não sei como isso pode acontecer, pois quem trabalha na educação neste nosso país, sabe muito bem que as ideias de Paulo Freire nunca foram implementadas em nossas escolas. Como querem tirar Freire das escolas, se ele nunca adentrou a elas?

Aqui no Brasil nosso educador é estudado apenas a nível acadêmico, ficando perdido em trabalhos de conclusão de curso e teses, tudo elaborado nas universidades, e boa parte sem sentido prático, sem diálogo com a educação básica.

Quanto ao pensamento político de Paulo Freire, posso não concordar com algumas de suas posições, mas daí a pichá-lo de revolucionário comunista, de desvirtuador da juventude, de agitador do professorado e outras coisas que nem vale a pena aqui recordar, vai uma grande distância do que realmente ele pensou, fez e representa para a educação.

Vale aqui lembrar que essa tentativa de jogar um educador brasileiro na lata do lixo, no limbo da história pedagógica, já havia acontecido com Anísio Teixeira, que nas décadas de 1960 foi acusado de querer implantar no Brasil a educação comunista. Respondendo aos seus detratores, Anísio dizia que a única educação da qual ele não tinha conhecimento, era justamente essa tal de educação comunista. Anísio Teixeira é outro educador injustiçado em nossa história.

Penso aqui comigo: será que os atuais críticos de Paulo Freire, de fato leram suas obras? Será que fizeram, com calma, discernimento e isenção ideológica, a leitura do Pedagogia do Oprimido, do Pedagogia da Autonomia, do Pedagogia da Solidariedade, entre outros escritos? É bem possível que mal conheçam o pensamento freireano, mas como ele se declarava adepto do socialismo e era filiado a um partido de esquerda, oposicionista ao já estabelecido, todas as pedras lhe são arremessadas.

Por mais paradoxal que pareça, esse ataque é compreensível. Afinal, as elites estabelecidas nos privilégios, na corrupção, no poder a qualquer custo, não querem que a educação faça pensar, que desenvolva a criticidade e o senso moral nas novas gerações, então as escolas têm que ficar como estão. Como o pensamento de Paulo Freire levaria a educação para esse novo paradigma, tão necessário, os ultra conservadores o pintam como se fosse o diabo em pessoa.

Diabo, aliás, que proclamou que o amor deve ser a base da educação, que a educação deve formar cidadãos éticos e que, vejam só, acreditava em Deus.

Bem, em resumo, sim, eu contrataria Paulo Freire, e com muito gosto, e teria com ele maravilhosos diálogos sobre educação, dando-lhe toda liberdade para revolucionar a escola, transformar as pessoas que, assim, transformariam a sociedade humana para muito melhor do que é hoje.

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Quanto vale a vida?

A vida de um ser humano pode ser quantificada num determinado valor financeiro? Em outras palavras, podemos afirmar que a vida de uma pessoa vale tantos reais, enquanto a vida de outra pessoa vale outros tantos reais? Sabemos que as companhias seguradoras trabalham com tabelas determinando valores para cada sinistro, inclusive para o caso de morte da pessoa, e que em tragédias, indenizações financeiras às famílias dos que faleceram são estabelecidas, mas será que o dinheiro pode representar o valor de uma pessoa?

Tabelas e valores não vibram no sentimento, não têm vida própria e, portanto, não podem representar um ser humano, que somente pode ser avaliado qualitativamente, e não quantitativamente. É por isso que nos opomos à avaliação escolar por provas e notas, pois é uma avaliação apenas quantitativa, e que não leva em conta o desenvolvimento do ser integral, com suas potencialidade e seu ritmo próprio de aprendizagem.

Será que um aluno, que é um ser humano que pensa e sente, pode ter sua vida quantificada numa determinada nota? E como considerar essa nota representativa, se ela apenas conceitua um momento estanque da vida escolar e pessoal desse aluno?

Estamos tão formatados em tudo quantificar em avaliação por nota ou por valor financeiro, que não nos demos conta do quanto desumanizamos o processo educacional e, por consequência, a própria vida.

Uma tragédia natural equivale a uma perda de tantos milhões ou bilhões na economia. Uma tragédia provocada pelo ser humano representa custo de tantos milhões ou bilhões. O falecimento de uma pessoa representa determinado valor a ser pago pelo seguro de vida. Passar ou não de ano na escola depende de uma nota média preestabelecida, a qual se alcança através de exames em provas que avaliam a memorização de conhecimentos. Essas provas não levam em conta a pessoa humana do aluno.

Um jovem sai da escola diplomado, “apto” a ingressar no ensino superior numa universidade, muitas vezes sendo analfabeto funcional. E quando voltamos nosso olhar para área comportamental/atitudinal, vemos um jovem indolente, egoísta, não cooperativo, que não sabe pensar por conta própria, violento, pois isso não foi trabalhado durante a educação básica, embora ele tenha passado pela escola e cursado a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio.

Que avaliações do seu desenvolvimento foram feitas? Provavelmente colou nas provas e se pendurou nos colegas nos trabalhos em grupo. Que cidadão ele será? Que profissional teremos no mercado de trabalho?

É urgente a necessidade de humanizar a educação e a escola, levando em conta o real progresso do educando, sua participação ativa no processo de aprendizagem, sua aquisição de autonomia assumindo as correspondentes responsabilidades. Avaliação que não levam conta valores e virtudes, comportamentos e atitudes, não é avaliação.

Afinal, quanto vale a vida de um ser humano? Um número ou um conceito podem dar resposta satisfatória?

Está na hora de pensarmos com profundidade sobre essas questões tão importantes, pois disso depende o rumo da humanidade. 

segunda-feira, 6 de setembro de 2021

Fazer diferente num sistema fechado

Como utilizar novas metodologias se o sistema de ensino exige que façamos isso ou aquilo de acordo com as normas e diretrizes emanadas dos órgãos responsáveis pelo educação?

Essa pergunta é recorrente entre os professores quando apresentamos o projeto Escola do Sentimento e mostramos escolas que fazem diferente, classificadas como escolas inovadoras.

É verdade que o sistema exige provas avaliativas, notas classificatórias, organização escolar por idade e séries, entre outras coisas, mas nada disso impede que o professor faça a diferença e transforme sua prática pedagógica na escola, bastando saber, ao final, traduzir o desenvolvimento cognitivo, emocional e atitudinal do aluno no histórico escolar exigido pelas normas da secretaria de educação, as normas do sistema vigente.

Muitos professores e pedagogos não sabem que Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional permite a autonomia administrativa e pedagógica da escola, e que sua organização pode ter diversas organizações. Isso está muito claro, com todas as letras, no artigo 23:

A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.

§ 1º A escola poderá reclassificar os alunos, inclusive quando se tratar de transferências entre estabelecimentos situados no País e no exterior, tendo como base as normas curriculares gerais.

§ 2º O calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais, inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta Lei.

Está bem claro: organização em séries anuais, ou por períodos, ou ciclos, ou por grupos não seriados, ou por forma diversa de organização, obedecendo o que recomenda o processo de aprendizagem.

Quem foi que disse que toda escola tem que obedecer a seriação por idade? Quem foi que disse que todo professor tem que dar aula? Quem foi que disse que a avaliação tem que ser feita por provas e notas? Onde essas coisas estão escritas na lei que rege a educação brasileira?

É muito cômodo formatar o sistema numa determinada maneira, pois isso facilita a fiscalização e a aplicação de normas gerais, mas, em compensação, a formatação atropela o processo educacional, não leva em conta a individualidade única de cada professor e de cada aluno, engessando o sistema e trazendo resultados duvidosos quanto à sua qualidade.

O professor pode e deve fazer diferente para fazer a diferença. Se o sistema exige que seu trabalho seja transcrito em históricos escolares com médias avaliativas, que seja, embora não compactuemos com isso, pois nenhuma quantificação pode transcrever a qualificação, mas que isso não o impeça de mudar a metodologia e fazer uma escola humanizada, integrada com a família e a comunidade, dinâmica, participativa, onde o processo de aprendizagem dará autonomia e respeitará o ritmo de cada aluno.

O sistema pode ser fechado, formatado, mas é com força de vontade e ações pedagógicas de qualidade que poderemos transformá-lo.

Vídeo - O Jovem e a Dinâmica Educacional

O vídeo sobre educação espírita O Jovem e a Dinâmica Educacional aborda a importância da participação do jovem no processo ensino-aprendizag...