segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

O homem no centro da vida

A primazia do homem supõe que ele estará colocado no centro das preocupações do mundo, como um dado filosófico e como uma inspiração para as ações. Dessa forma, estarão assegurados o império da compaixão nas relações interpessoais e o estímulo à solidariedade social, a ser exercida entre indivíduos, entre o indivíduo e a sociedade e vice-versa e entre a sociedade e o Estado, reduzindo as fraturas sociais, impondo uma nova ética, e, destarte, assentando bases sólidas para uma nova sociedade, uma nova economia, um novo espaço geográfico. O ponto de partida para pensar alternativas seria, então, a prática da vida e a existência de todos.

Milton Santos

Hoje as relações sociais estão empoderadas no dinheiro e na informação. A economia de cada nação e a economia global regem os destinos humanos, muitas vezes sem considerar a existência do próprio ser humano, decorrendo dessa anomalia a globalização da miséria e a concentração de renda em poucas mãos. É um modelo perverso, desumano, perpetuado por interesses de grupos minoritários que controlam o Estado, somados aos interesses do lucro a qualquer custo das Empresas. A pergunta que se impõe é se podemos alterar esse modelo, se podemos transformar esse sistema dito neoliberal, enfim, se podemos recolocar o homem no centro do mundo, como fator principal da vida.

Em genial e sólida análise, o mestre Milton Santos afirma categoricamente que sim, em sua obra analítica Por Uma Nova Globalização – Do Pensamento Único à Consciência Universal.

Para quem não sabe, Milton Santos (1926-2001) é um dos grandes pensadores brasileiros respeitado internacionalmente, mas pouco conhecido dos próprios brasileiros. Com mais de 30 livros publicados e 400 artigos científicos, foi professor emérito da Universidade de São Paulo. Geógrafo conceituado, humanista, pacifista, é considerado um dos mais renomados intelectuais do Brasil, e com um detalhe importante: era negro, afrodescendente, tendo que vencer os preconceitos e discriminações raciais, totalmente intoleráveis, dessa condição.

A transformação pode ocorrer, e haverá de ocorrer, quando a vida do ser humano, de todos os seres humanos, for colocada como foco gerador das políticas. Do homem para o homem, pelo homem e com o homem. Será um novo paradigma consolidado através da solidariedade e da ética regendo todos os interesses.

Esse caminhar transformador passa, necessariamente, pela educação das novas gerações, uma educação humanizada substituta do ensinar pelo aprender, permitindo que se pense com liberdade, que se exerça a autonomia com responsabilidade, que se desenvolva a empatia nas relações interpessoais, que se pratique a solidariedade. Essa educação assegurará, como diz Milton Santos, a compaixão nas relações.

O homem não será mais predador do homem e da natureza, compreendendo que vive com eles e que essa vivência deve ser feita em harmonia, pois existe uma interdependência a ser respeitada, sob pena de continuar a carregar sobre os ombros males de toda ordem, tanto no nível individual quanto coletivo, como temos assistido.

O mal não é, propriamente, a globalização, mas sim como a entendemos e como a estamos formatando, priorizando o dinheiro e a informação para reger a vida humana, o que leva à desconstrução da educação, pois não é interessante para os grupos hegemônicos, sejam estatais ou empresariais, o crescimento intelectual e emocional do ser humano, pois quanto mais intelectualizado e equilibrado, mais ele tenderá para uma nova globalização, colocando-se como sujeito do processo, não mais priorizando a individualidade e sim a coletividade.

Cremos que esse novo paradigma é irreversível, e que todas as tentativas de frustrar sua evolução serão inócuas, não passando de obstáculos momentâneos geradores de crises que mais fortalecerão o desejo da transformação social, da obtenção de novas relações interpessoais com base na solidariedade e, repetimos, na ética.

O homem no centro das preocupações do mundo, no centro da vida, eis para onde estamos caminhando, mesmo que muitos assim não o queiram, mas o movimento maior das massas será a força transformadora da sociedade humana para melhor.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Vacina educacional

O início do século 20 foi marcado pela epidemia da gripe espanhola, com 500 milhões de pessoas infectadas, calculando-se em torno de 20 milhões de mortes, acompanhando o final da trágica primeira guerra mundial com 17 milhões de mortos (esse número é variável, podendo ser maior), ou seja, somando-se as baixas da epidemia viral com as baixas da guerra mundial, temos 37 milhões de mortes, com algumas pesquisas alegando que esse número pode chegar a 50 milhões de pessoas vitimadas fatalmente.

Apesar de números tão estarrecedores, isso não evitou que o egoísmo, o orgulho, a indiferença e a fome de poder material levasse o ser humano a uma nova guerra mundial, vinte anos depois, resultando em 70 milhões de vítimas e ampla destruição, com dores e sofrimentos inenarráveis.

Durante o século 20 tivemos pelo menos 21 genocídios espalhados pelo mundo, levando aproximadamente 100 milhões de pessoas à morte, tendo por causa perseguições étnicas e conflitos religiosos.

Ao todo, somando-se a gripe espanhola, as duas guerras mundiais e os genocídios, chegamos à impressionante e dolorosa constatação de 207 milhões de seres humanos mortos por tragédias violentas causadas pelo próprio ser humano. Isso sem contar as inúmeras guerras civis que aconteceram em várias partes do mundo.

O que aprendemos com tantas tragédias? Quase nada.

Vinte anos de século 21 e as tragédias humanas continuam as mesmas. Perseguições étnicas, disputas religiosas, guerras civis, ameaças de invasão e, agora, a pandemia do novo coronavírus, que já infectou mais de 100 milhões de pessoas e vitimou mais de 2 milhões. E continuamos a assistir a hipocrisia, o negacionismo, o egoísmo, a leviandade, a falta de sensibilidade, o preconceito campearem com seu cortejo de destruição, dor e sofrimento.

É que deixamos passar um século, um dos piores séculos que a humanidade já teve, se não mesmo o pior, sem acreditar na vacina da educação para mudar esse quadro, para transformar as pessoas e a coletividade.

A verdade é que, apesar das vastas verbas nacionais e internacionais dedicadas à educação, elas têm sido aplicadas naquilo que não é educação, mas somente instrução, memorização, intelectualização, bem longe do discurso sobre os pilares da educação e a formação para a cidadania. As crianças e os jovens da atualidade não sabem se colocar no lugar do outro, não desenvolveram a empatia, estão, como as gerações passadas, insensíveis e indiferentes.

Em meio à pandemia, vemos jovens ávidos por continuarem nas baladas, lotando as praias, dando péssimos exemplos à sociedade. Vemos adultos radicalizando ideologias, lutando pelo poder a qualquer custo, desequilibrando a natureza planetária, mais interessados em si mesmos e nos seus grupos de interesse do que o bem estar de todos.

Onde a falha? Está na falta da verdadeira educação.

Insistimos em não querer nos vacinar moralmente. Insistimos em cada um por si. Insistimos em substituir o educar pelo ensinar, ensinando coisas inúteis e que não alcançam as causas dos problemas que enfrentamos, pois a educação que promovemos não combate o egoísmo e o orgulho, a indiferença e a hipocrisia, a corrupção e a violência. Temos a capacidade de saber fatos históricos, decorar acidentes geográficos, saber nadar, falar em dois ou mais idiomas, e não somos capazes de nos amar, de saber conviver com as diferenças, de abrir mão do personalismo.

O único remédio eficaz é a educação, mas enquanto fugirmos dela, maquiando sua ação com coisas que ela não é, tenderemos perigosamente para repetir no século 21 o que fizemos no século 20, como se não fossemos seres humanos, pois somente o avestruz, que é uma ave, enterra a cabeça na terra para não ver os problemas e ter que enfrentá-los de cabeça erguida, para o encontro de uma solução definitiva que, queiramos teimosamente não admitir, está toda na educação.

Está mais do que na hora de aplicarmos essa vacina.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

Avaliação de quem deveria fazer

O educador, filósofo e escritor Mario Sergio Cortella, conhecido pela sua vasta e profunda atuação, em entrevista concedida para a revista Isto É (29/01/21), indagado sobre sua avaliação do trabalho do atual Ministro da Educação, Milton Ribeiro, respondeu de forma incisiva, sem deixar dúvida, remetendo-nos a sérias reflexões:

Não tivemos a presença do Ministério da Educação como órgão orientador até agora, durante os 24 meses de governo. Então, não é nem possível avaliar, pois não há nada a ser avaliado. Nada foi feito. Não há clareza nenhuma. Não dá nem para fazer uma comparação com governos anteriores, pois não se tem um programa nem projetos.

Como não concordar com Cortella?

Até mesmo o que sempre foi feito, como o Enem, foi um choque de falta de planejamento e organização, com mais 50% de abstenção na prova presencial, e mais de 60% por cento de abstenção na prova digital, a que se somam as falhas técnicas. Um festival de horrores para o que já um horror, pois o Enem é uma prova vestibular disfarçada de prova de avaliação do ensino médio.

Dois anos do novo governo federal e três ministros da educação depois, não se sabe para onde vai a educação brasileira. O atual governo tem síndrome de pânico com tudo o que foi feito antes dele, não dando continuidade a nenhum planejamento ou projeto, e, em compensação, nada apresentando, piorando a situação grave da educação brasileira, que há muito tempo está com o sinal vermelho aceso.

Para sermos justos, há um projeto, único, do atual governo na área da educação: ampliar os colégios militares, espalhando-os por todo o Brasil. Percebe-se um sonho constrangedor, louco: militarizar a educação brasileira. Absurdo total!

Felizmente as instituições democráticas do legislativo e do judiciário, assim como outras da sociedade civil, não estão permitindo essa loucura, que não foi sonhada nem mesmo quando as forças militares estiveram no poder no período 1964-1985.

O MEC não tem que resolver tudo, é verdade, mas como lembra Cortella, precisa orientar, não pode deixar as secretarias de educação à deriva, sem norte, sem rumo, cada uma se virando como pode. Se é para ser assim, não há razão para o Ministério da Educação existir, pode ser extinto que não vai fazer falta.

O atual ministro não é de falar muito, nem de aparecer. Não se sabe o que está fazendo ou pretende fazer. Nenhuma política educacional está claramente delineada, não se sabe qual é o projeto político pedagógico do ministério para a educação do nosso Brasil. E tão caótica é a situação que, antes do término de 2020, os reitores das universidades federais se rebelaram contra a ordem da volta às aulas presenciais em meio à pandemia do novo coronavírus já no início de janeiro, fazendo com que o MEC adiasse a decisão para o mês de março.

É triste constatar que o que deveria ser essencial, a educação, é tratada como um nada, sem nenhuma consideração por parte do atual governo federal.

E ainda mais triste verificar que os ministros se sucedem defendendo ideologias radicais, anticientíficas e ultrajantes.

Então, avaliar o quê?

O fato é que nada aconteceu, nada foi feito e não se sabe o que virá pela frente, se é que tem algo para amanhã ou depois no âmbito do Mistério da Educação. Aliás, ele continua existindo lá em Brasília, ou o prédio já foi demolido por falta de uso?

Vídeo - O Jovem e a Dinâmica Educacional

O vídeo sobre educação espírita O Jovem e a Dinâmica Educacional aborda a importância da participação do jovem no processo ensino-aprendizag...