O evangelho segundo o espiritismo

Quando, no ano de 1864, Allan Kardec lançou o livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, estudando os ensinos morais de Jesus, teve por finalidade, conforme orientação dos Espíritos Superiores, estabelecer as bases religiosas da Doutrina Espírita, mas tomando cuidado para que os adeptos e estudiosos não confundissem o Espiritismo com uma religião formal, institucionalizada, o que nunca foi nem deverá ser. Desde o lançamento de O Livro dos Espíritos, em 1857, as consequências morais de sua ciência e de sua filosofia estavam claras, contudo era necessário estabelecer os vínculos com o guia e modelo da humanidade, revivendo seus ensinos em espírito e verdade.

Na época, algumas pessoas teceram críticas, pois acreditaram que Kardec estava reescrevendo o Evangelho, que um novo Evangelho, o espírita, estava surgindo, mas isso nunca foi verdadeiro. Trata-se de uma obra que estuda o Evangelho através dos princípios que formam o Espiritismo, tais como Deus, imortalidade da alma, reencarnação, mediunidade, evolução. Portanto, não se trata de um novo evangelho, mas sim de estudo dos ensinos do modelo e guia da humanidade, ofertando a todos a visão que o Espiritismo possui desses ensinos.

Com esse lançamento, o Espiritismo posicionou-se firmemente como doutrina cristã, como doutrina inserida na história do Cristianismo, mas ao mesmo tempo, por não possuir dogmas, nem sacerdócio, nem paramentos, nem rituais, é uma doutrina para todos os livres pensadores, e mesmo para adeptos de outras crenças, sejam filosóficas ou religiosas, pois a finalidade maior do Espiritismo é formar seres humanos de bem, pessoas voltadas a fazer o bem, pensando e agindo para o bem coletivo.

Especificamente no Brasil, o Espiritismo é conhecido como religião. É comum, quando o adepto é perguntado sobre qual religião ele professa, responder: sou espírita! Ou, se perguntado sobre qual igreja frequenta, responder: o centro espírita! Nos formulários oficiais de pesquisa dos órgãos responsáveis por levantamentos estatísticos, o Espiritismo é sempre classificado como religião. É muito difícil, raro mesmo, ver o Espiritismo classificado e entendido como ciência ou como filosofia, o que de fato ele é, pois seu aspecto religioso assumiu proporções muito maiores.

Compreendemos que isso, no contexto cultural brasileiro, tenha acontecido, e que muitas pessoas pensem que para ser adepta do Espiritismo tenha que frequentar o centro espírita, quando isso não é verdadeiro, pois qualquer pessoa pode estudar o Espiritismo, seguir seus princípios, aplicá-los em sua existência, sem necessariamente estar vinculado a um centro espírita ou mesmo a um grupo de estudo, embora reconheçamos a importância da instituição e do grupo de estudo, pois somos seres sociais, seres de relação, e aprender e praticar em conjunto com outras pessoas é bem melhor, é mais produtivo.

Agora, não adianta dizer-se espírita e não viver de acordo com os ensinos da Doutrina Espírita. Não adianta frequentar o centro espírita e manter-se fofoqueiro, hipócrita, desonesto. Não adianta estudar o Espiritismo e não ser um bom pai ou boa mãe, não ser um bom profissional. Ser espírita não pode significar apenas um rótulo; dizer que acredita na reencarnação e nada fazer para se desligar das ideias materialistas sobre a vida; afirmar que acredita na vida depois da morte e continuar a tocar a existência mantendo diversos vícios morais.

O fato de manter a realização do evangelho no lar nem sempre significa estar realizando a autoeducação, a chamada reforma íntima. Muitos somos fiscais da vida alheia, quando deveríamos ser fiscais de nós mesmos.

Em resumo, o Espiritismo não é mais uma religião cristã, não pode ser um rótulo que ostentamos para exibição, deve ser nosso roteiro de vida, quando colocamos seus ensinos em prática, procurando vivenciá-los com todas as nossas forças, pois temos nele uma doutrina filosófica, científica e de profundas consequências morais, revivendo as belas e maravilhosas lições de Jesus Cristo.

Nos 160 anos de lançamento de O Evangelho Segundo o Espiritismo, compreendamos que não se trata meramente de um livro religioso, mas de uma obra que faz luz sobre o maior evento que a humanidade já assistiu: a vinda do Messias, do Enviado de Deus, para nos entregar a lei de amor, que rege toda a criação universal, e isso transcende qualquer sentido religioso institucional, pois trata-se da religião do Espírito imortal que somos.

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