terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Uma professora e seu aluno difícil

Jovem e idealista, ela estudou, formou-se e fez concurso público para o magistério na rede estadual de ensino. Passou e, apesar de morar na capital do estado, foi indicada para trabalhar numa escola em cidade do interior. Não pensou duas vezes: fez as malas e pôs os pés na estrada, como se diz, viajando para onde deveria realizar seu sonho de ser professora.

Chegou, conheceu a cidade, arrumou onde se hospedar e se apresentou na escola. A diretora e a coordenadora pedagógica, percebendo o entusiasmo da novata e sua quase nenhuma experiência, a encaminharam para uma turma que reunia crianças repetentes e analfabetas, rejeitadas pelas outras professoras. Ela aceitou o desafio.

Início do ano letivo e o desafio de alfabetizar crianças que já deveriam saber ler e escrever, além de saber as operações matemáticas básicas. Nossa professora estudou, planejou, preparou atividades e deu início ao trabalho. Em breve tempo percebeu que um dos alunos era muito passivo, não participativo e bem pouco desenvolvido em habilidades, normalmente ficando a um canto da sala, arredio às atividades propostas.

Esse aluno era o Michael Jackson, nome herdado do famoso cantor norte-americano, do qual o pai era fã. E por falar no pai, tinha ido embora de casa, abandonado a família, e a mãe tinha morrido de desgosto. Como os avós eram idosos, ele vivia entre os tios, que cuidavam dele como podiam: eram todos pobres, sem recursos, e pouco sabiam sobre educar uma criança.

A professora não desistiu. Aproximou-se, deu carinho, e estava sempre incentivando: “venha, Michael, eu lhe ajudo”; “você consegue, Michael”; “tenta, Michael, vamos…”. Mas, qual, ele não reagia. Entrava mudo e saía calado.

Conversando com suas colegas professoras ouvia que não adiantava perder tempo com ele, era caso perdido, não tinha mais jeito. Não se conformando com essa análise, procurou novos métodos, novas atividades e… nada! Michael Jackson simplesmente não se modificava, parecia não ter interesse por coisa alguma.

E assim passou o ano, e passou o segundo ano, e finalizou o terceiro ano. Desesperada, deprimida, a professora chegou à conclusão que ela era um fracasso e que devia mudar de ares, antes de enlouquecer. Pediu transferência e foi trabalhar em escola de outro município. Mas aquele “fracasso” a acompanhou e, tempos depois, abandonou o sonho de fazer carreira no magistério. Voltou para a capital e se acomodou.

Certo dia, voltando para casa depois de fazer compras no supermercado, viu-se frente a um jovem que lhe sorria, a dizer:

Professora! Que prazer em revê-la.”

Ao que ela respondeu:

Desculpe, mas não sei quem é você.”

Bem, eu estou bastante modificado. A senhora me conheceu quando criança, lá na turma de analfabetos da escola.”

Pode ser, mas quem é você?”

Sou o Michael Jackson.”

Ele contou que a nova professora não quis saber dele, então, recordando a jovem professora que passara três anos tentando que ele se desenvolvesse, reagiu e, finalmente, conseguiu sair de si mesmo e crescer.

Muito obrigado, professora, devo à senhora o que hoje sou.”

A ex-professora chegou em casa, enxugou as lágrimas e escreveu:

Se nós, professoras, acreditássemos mais no que fazemos, teríamos muito mais histórias bonitas para contar, do que queixas para fazer.”

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Preconceito e genocídio

A hipocrisia do ser humano, notadamente em alguns, parece não ter limites. Como exemplo disso temos os que, apesar de todas as provas fotográficas, em vídeo, em relatórios de época e testemunhais, ainda hoje afirmam que a perseguição, prisão, tortura e extermínio dos judeus durante a segunda guerra mundial (1939-1945), não aconteceu, que tudo é fantasia, mentira. Não, não é fantasia, não é mentira, é verdade, é realidade. Sim, o holocausto dos judeus naquela época foi realizado de forma sistematizada pela loucura e fanatismo dos nazistas. Tivemos na história humana uma página de horror sancionada pelo preconceito, por falsas ideais de superioridade racial, manchando a civilização com o maior genocídio já praticado conscientemente.

Infelizmente não aprendemos a lição. Hoje, em pleno século 21 do terceiro milênio da cristandade, assistimos entristecidos e compungidos o preconceito contra os povos indígenas, atingindo de forma genocida os Yanomamis, que tiveram suas terras invadidas ilegalmente, e sob beneplácito do último governo federal, por garimpeiros e milicianos, sendo levados à fome e miséria, com centenas de vítimas, entre elas crianças que não tiveram nenhuma chance de sobreviver, quando a fome e as doenças poderiam ter sido evitadas.

Mas evitar porquê? Segundo algumas pessoas os indígenas só atrapalham o progresso da nação. São indolentes e custam caro para o governo. As reservas indígenas são muito ricas e precisam ser exploradas para o bem econômico do Brasil. Vamos acabar com os povos indígenas, gritam, esquecendo que eles também são seres humanos, que eles também são brasileiros, que eles possuem os mesmos direitos que qualquer outra pessoa, e que menosprezá-los é mostrar preconceito, discriminação, intolerância, racismo.

Vamos repetir aqui no Brasil o que os nazistas e fascistas fizeram na Alemanha e na Europa naqueles tristes dias de guerra? Isso é estúpido e insensato, não tem justificativa.

Assistimos quatro anos de um governo racista, misógeno, hipócrita, que tudo fez contra a ciência, a cultura, a educação, o meio ambiente e as chamadas minorias, com discursos e ações preconceituosas, estabelecendo diretrizes de perseguição e destruição, sem se importar com a vida de quem não pensasse pela mesma cartilha. Tivemos no poder uma extrema direita ultra conservadora e radical, que passou todo o tempo maquiando sua ação nefasta com discursos de defesa da liberdade e democracia, entendidas, claro, à moda deles.

Antes de continuar, esclareço aos críticos de plantão, que outra coisa não fazem a não ser destruir o que não lhes agrada, que não sou de esquerda, que não sou comunista, que não sou petista (também tenho minhas críticas a algumas de suas ideias e ações). Quem me acompanha sabe que sou espírita, que procura pautar minha vida pelos princípios do Espiritismo, uma doutrina cristã que tem por bases a imortalidade da alma, a reencarnação e a lei de evolução. Não sou um revolucionário e procura agir de acordo com a verdade e a minha consciência, pensando no bem para todos.

A questão do ocorrido com os Yanomamis é a constatação de um fato, que nenhuma maquiagem poderá ocultar.

Apesar de ser uma nação predominantemente cristã, o Brasil está longe de ser uma nação sem preconceitos e discriminações. Estamos longe de ter justiça e direitos iguais para todos. Temos racismo, temos perseguição a determinados grupos sociais considerados minoritários e fora dos “padrões” (!?), e nossa educação tem mantido esse quadro, quando deveria combatê-lo.

Que novos dias despontem sobre nossa história. Que ações governamentais e civis de defesa dos direitos humanos possam fazer uma nova história. E que os responsáveis pelo genocídio dos povos indígenas respondam perante a justiça por esse mal hediondo. Ou vamos deixar que a hipocrisia vença mais uma vez a verdade?

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

O professor é um resolvedor de problemas

Acessando o site Só Notícias Boas deparei-me com a reportagem, aliás espalhada pelas mídias de comunicação, sobre a atitude de uma professora, que auxiliou uma aluna durante uma prova na faculdade. Que auxílio foi esse? Vou resumir a história para melhor entendimento de nossa abordagem. O episódio aconteceu na Faculdade de Direito da cidade de Sorocaba, no estado de São Paulo. Uma aluna da professora Íris Lippi ficou sem com quem deixar sua filha, ainda um bebê, mas não podia faltar à aula, pois era dia de uma prova importante. Não teve dúvida: levou a filha no colo, junto com uma bolsa com tudo o que necessitaria para cuidar da menina. E foi assim que adentrou à sala e se posicionou para fazer a prova. Não seria fácil se concentrar, ainda mais se a criança ficasse agitada. Assistindo a cena e recordando quando seus filhos eram pequenos, e reconhecendo o amor e o sacrifício de que somente as mães são capazes, a professora Íris Lippi não pensou duas vezes, dirigindo-se à aluna e tomando o bebê em seu colo para cuidar do mesmo enquanto a mãe fazia a prova. A cena foi fotografada e filmada, sendo publicada nas redes sociais.

O episódio viralizou nas redes sociais e chegou à imprensa. Entrevistada, a professora Íris Lippi fez a seguinte declaração: “Professor é isso, um resolvedor de problemas. É alguém que está ali para passar o conteúdo, para estar disponível para o aluno quando precisa. E a gente, como professor, precisa compreender as dificuldades que os alunos têm.”

Talvez fosse mais fácil dizer à aluna que ela não poderia fazer a prova com seu filho/bebê no colo. Talvez fosse mais cômodo fingir que não estava vendo, deixando a aluna “se virar sozinha”, afinal o problema não era dela, professora. Talvez…

Como nos lembra o educador José Pacheco, a escola são pessoas. A escola não é um prédio frio. A escola são pessoas em movimento, em interação. Pessoas que têm sua própria vida, seus pensamentos, seus sentimentos, suas alegrias e suas tristezas. Será que o objetivo da escola é tão somente realizar a formação técnico-intelectual dos alunos? E os alunos não são pessoas? Será que o professor é apenas um passador de conteúdos curriculares?

Nossa professora tomou uma atitude humana. Ela compreende que muito além de ali estar para ensinar conteúdos da sua disciplina curricular naquele determinado curso, ela ali está como pessoa, como ser humano, e que seus alunos também são pessoas, também são seres humanos. Quem não tem aquele dia em que nada dá certo? Quem não precisa de ajuda dos outros tantas vezes na vida? A Íris Lippi entende isso e se coloca à disposição dos alunos para ajudá-los a resolver seus problemas.

É possível que você que está no magistério e agora lê este texto, discorde. É seu direito. Afinal, como resolver os problemas de 30 a 40 alunos em várias turmas, dia após dia? Ouso lembrar que essa disponibilidade minimiza os problemas, e seu exemplo leva os alunos a compreenderem o bem que faz a cooperação entre eles, humanizando o processo ensino-aprendizagem. Não é todo dia que o professor terá que cuidar do bebê de um(a) aluno(a), não é mesmo?

Estar disponível para o aluno quando ele precisar. Compreender as dificuldades do aluno, tanto quanto o professor gostaria de ter as suas dificuldades compreendidas. Pode parecer estranho, mas a verdade é que nós, seres humanos, precisamos humanizar a escola e a educação.

Somente a humanização pode resolver os problemas que hoje carregamos na educação, visando um futuro melhor para a humanidade.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

Em defesa da democracia

O egoísta e orgulhoso é normalmente um mal perdedor e utiliza a violência, seja psicológica ou física, para impor sua vontade, achando-se acima de tudo e de todos, e sempre tendo desculpas, numa lógica distorcida, para justificar suas ações. Fere a lei e quando esta o aciona, diz estar sendo perseguido, cerceado, confundindo a liberdade de expressão com o desrespeito à ordem e à própria lei. Somos uma humanidade civilizada, regida democraticamente por leis e regras de convivência estabelecidas em comum acordo, e com mecanismos apropriados para os devidos questionamentos e possíveis mudanças, onde não cabem nenhum ato que violente a segurança pública e queira subverter a democracia.

Somos uma nação predominantemente, na verdade majoritariamente, cristã, ou seja, nossa população segue denominações religiosas cristãs, mas parece que há um equívoco quanto a isso, pois vemos pessoas religiosas, que deveriam seguir os ensinos de Jesus, que deveriam pautar suas condutas pelo Evangelho, em ações de violência contra os outros e contra as instituições públicas, tentando impor a todo custo um discurso golpista, que no fundo apenas atende a interesses próprios ou de grupos, e que prejudicam a maioria. É típico de pessoas egoístas e orgulhosas, em franca oposição ao que ensinou e exemplificou o maior dos Mestres que a humanidade já teve, e que essas pessoas dizem acreditar e seguir.

Pseudo líderes, que querem apenas se locupletar em causa própria através da tomada do poder, fazem da população massa de manobra, servindo-se da própria lei que condenam e querem subverter, para se acobertar e se colocar a salvo de quaisquer responsabilidades. São santos e honestos até que se prove o contrário, e nunca tem nada a ver com acontecimentos antidemocráticos de caráter violento. É típico de orgulhosos e egoístas que não concebem perder, que não concebem não ser sempre vencedores.

Agora, o que precisamos nos perguntar é porque temos tantas pessoas egoístas, orgulhosas e antidemocráticas em nosso país, a ponto de conseguirem tumultuar o processo democrático da nação. Onde falhamos?

Falhamos na educação das novas gerações. Há décadas crianças e jovens estão recebendo apenas e tão somente instrução do intelecto, formação técnico-profissional. A formação moral foi deixada de lado, subvertida, tanto na família quanto na escola. A formação religiosa, por sua vez, foi acomodada a interesses que nada tem a ver com o Cristianismo que, insisto, dizemos seguir, mas não praticamos. A questão está na educação que que deixamos de promover, substituída que foi pela instrução intelectual, pelo acúmulo de conhecimentos.

Temos intelectuais nas mais diversas áreas do conhecimento, mas isso não quer dizer que sejam ao mesmo tempo honestas, éticas, solidárias, humildes. A formação intelectual não é sinônimo de formação moral, não quer dizer que a pessoa, apesar de acumular diplomas e certificados, tenha bom caráter.

Precisamos corrigir o que estamos fazendo na educação. É claro que trabalharmos pela alfabetização de todos e todas é importante. É claro que oportunizarmos a melhor formação técnica e profissional a todos e todas também é importante. Não somos contra essas iniciativas, que também fazem parte da educação. Alertamos para a essência da educação: a correção das más tendências de caráter; a criação de bons hábitos; a espiritualização do ser humano; o formar para saber pensar no bem coletivo, enfim, a promoção da educação moral (que nada tem a ver com a antiga disciplina de educação e moral e cívica).

É através da educação que formamos gerações democráticas que não admitirão a violência como caminho para mudanças, pois terão aprendido o respeito aos outros e às decisões democráticas livremente escolhidas pela maioria. Essa educação combaterá o egoísmo e o orgulho através do desenvolvimento dos valores humanos, das virtudes, do sentimento, da ética.

O que estamos esperando para redefinir os rumos da educação brasileira? Uma tragédia humana antidemocrática que pode ser evitada?

domingo, 1 de janeiro de 2023

Já existiu, mas foi esquecido

Neste texto faço uma justa homenagem a uma educadora brasileira muito importante, que na década de 1960 esteve à frente de uma proposta pedagógico-escolar que, se tivesse tido continuidade, teria mudado a história da educação brasileira e, também, da nossa nação, mas infelizmente o projeto foi reduzido a pó por mentalidades retrógradas que então estavam à frente do governo.

Provavelmente você nunca terá ouvido falar de Maria Nilde Mascellani (1931-1999) e dos Ginásios Vocacionais da rede pública de ensino do estado de São Paulo, que funcionaram, num total de seis, entre os anos de 1961 e 1969, tendo a professora Maria Nilde à frente de sua coordenação.

A ideia e primeira experiência prática surge na cidade de Socorro/SP, com o nome de Classes Experimentais, já com a Maria Nilde à frente, tendo o governo do estado, através da secretaria de educação, tornado essa experiência escolar oficial, por força de lei, com o nome de Ginásio Vocacional, implementando-o no Brooklin (capital), e nas cidades de Americana, Batatais, Rio Claro, Barretos e São Caetano do Sul.

Maria Nilde e suas colaboradoras desenvolveram um projeto pedagógico e uma metodologia educacional ons faziam os jovens alunos:

1 – Aprenderem a pensar por si mesmos.

2 – Aprenderem a buscar a verdade dos fatos em diferentes fontes e a tirar suas próprias conclusões.

3 – Aprenderem a fazer conexões entre as diversas áreas do conhecimento.

4 – Aprenderem a interpretar e considerar diferentes contextos.

5 – Aprenderem a compreender fenômenos pela experimentação.

Os Ginásios Vocacionais educavam os jovens para serem agentes transformadores – homens e mulheres livres, donos de seus destinos.

O sucesso dos Ginásios Vocacionais passou a incomodar o governo a partir da tomada do poder pelos militares em 1964, pois eles não queriam uma nova geração que soubesse pensar, que utilizasse da criticidade e clamasse pela liberdade. Assim, pouco a pouco, o projeto foi solapado, até sua total extinção no ano de 1969, após a edição do famigerado e condenável Ato Institucional número 5, de tão triste memória.

A ditadura militar, com receio de sua repercussão, dos propósitos da escola e de sua expansão, em 1969, violentamente extinguiu os Ginásios Vocacionais. Em 12 de dezembro acontece, simultaneamente uma violenta intervenção militar em todas as unidades do Vocacional, com queima de arquivos, materiais, e fichamento de professores e coordenadores, inclusive de Maria Nilde Mascellani que foi, mais tarde, presa e torturada.

Apesar desses acontecimentos, Maria Nilde Mascellani continuou trabalhando como professora, até sua aposentadoria, mas nunca mais foi designada para estar à frente de qualquer iniciativa pedagógica.

Essa é a história.

Quantos educadores, quantos bons projetos pedagógicos já sufocamos neste nosso país? Inúmeros. Tudo poderia estar diferente, para bem melhor, mas a falta de visão dos dirigentes, e a falta de vontade política, tornaram o progresso social cheio de percalços.

Que a Maria Nilde Mascellani receba nossa gratidão e nosso reconhecimento, e que o exemplo dos Ginásios Vocacionais possa inspirar os educadores brasileiros de hoje e de amanhã.

Vídeo - O Jovem e a Dinâmica Educacional

O vídeo sobre educação espírita O Jovem e a Dinâmica Educacional aborda a importância da participação do jovem no processo ensino-aprendizag...